[REPORTAGEM]: Optimus Alive (Dia 3) | Passeio Marítimo de Algés | 15 de Junho de 2012



O terceiro dia do festival Optimus Alive foi "Aquele Dia". Com letra maiúscula. Esgotadíssimo, o mais ansiado por mais de 55 mil pessoas. Isaltino Morais declarou que o recinto se transformou numa grande cidade. Em grande parte só pela banda cujo nome se refletia nas t-shirts de uma em cada três pessoas que por lá andava. A multidão a marcar lugar à frente do palco era a maior do festival inteiro. Era apenas a banda mais requisitada desde a sua última vinda a Portugal, em 2002. Havia sempre aquele ligeiro tremor por baixo da epiderme de muita gente, o olhar apressado por cima de ombros e para o lado, em direção ao palco principal, não fosse o diabo tecê-las e os Radiohead aparecessem por lá antes do tempo.
Mas não é só de Radiohead que o alinhamento deste último dia da edição de 2012 se compôs, tendo os outros atos recebido grande atenção por parte do público. Recheado de bandas, grupos, compositores e cantautores nacionais e internacionais de pelo menos criar um semblante de reconhecimento pelo nome, o dia 15 de julho prometeu-se desde logo intenso.


Começou logo pela abertura do Palco Heineken por Eli “Paperboy” Reed, que dispôs logo um rock’n’roll de brilhantina e casacos de cabedal que não se escutava há algum tempo. “Isto é tão retro!” exclamava alguém, enquanto que os companheiros levavam as mãos aos céus em tom de brincadeira “Praise da lord!” Embora não inteiramente novo, estando perfeitamente encaixado nesta nova onda de nostalgia cultural que atravessamos, em que o vintage é cool, podemos dizer que o ato deste menino, que aprendeu a tocar piano e guitarra sozinho enquanto estudava, difere de muitos outros pelo seu entusiasmo honesto enquanto faz desfilar temas dos seus álbuns «Come and Get it!» e «Roll With You», como se saídos do Mississipi com a pompa e circunstância digna de santos que marcham por aí dentro. Fez apetecer uma camisola atada em volta dos ombros, um hambúrguer e um batido, especialmente servido por uma menina de patins.

Entretanto, o Palco Optimus Clubbing descartou o seu nome para dar lugar à música portuguesa. Abriu com os Laia, que, de adufes e feed das guitarras e as doze cordas da guitarra portuguesa, mostraram um rock experimental e um género musical mais facilmente assimilado ao “post-arraial português”, isto se nos dermos ao facilitismo e agarrarmo-nos ao título de um dos seus temas, “Arraial Montado”. Aproximaram-se e ficaram lá muitos.


Trabalhou com Alex Turner, cantou com a atriz Clémence Poésy (muitos reconhecem-na como Fleur Delacour nos filmes de Harry Potter), trabalha ocasionalmente com membros dos Oasis. Foi a estreia de alguém bem conhecido na cena britânica musical no palco secundário: Miles Kane, o qual a admiração de muitos(as) era bem visível. Companheiro de Alex Turner na banda The Last Shadow Puppets e antigo vocalista dos The Rascals, apresenta-se de calças com padrão felino, e dedica-se a um estilo musical muito conhecido pelos admiradores do rock internacional portugueses. “O quê? Estão a tocar os Arctic Monkeys?” Pergunta um distraído, mas de facto, temas como “Rearrange” ou “Telepathy” têm um estilo aparente. Afinal, Kane não tenta de facto esconder quem é e com quem anda. Pensamos que seria desonesto, e provavelmente a sua música não resultaria tão bem se o fizesse, proporcionando um bom e desenfreado espetáculo: “Obrigada, é a primeira vez que aqui estamos”, diz, e um membro do público pede-lhe a pick da guitarra, talvez mais mole que manteiga após o uso nos pesados refrões do seu último álbum «Colour of the Trap». Frenético. Satisfeitos os fãs e aqueles que acabavam de aderir (muitos mais os primeiros que os segundos, diga-se, mas as cabeças a baloiçar enquanto se ouvia “boa onda, boa onda!” eram mais que muitos), quer-se mais e em breve.

De volta ao Clubbing, encontramos um dueto do norte do país. Os Best Youth, duo de Catarina Salinas e Ed Rocha Gonçalves, tocaram um pop rock íntimo mas leve, baseado nas guitarradas “sem compromisso” de Ed e na voz sussurrada de Catarina. É uma performance cuja privacidade talvez ficasse melhor num recinto fechado, mas a química entre os dois membros é algo contagiante. Dá vontade de fazer uma marotice, interromper quase ao género de mãe intrometida. “Meninos, querem alguma coisa para comer? E um suminho, não?” Brincadeiras à parte, são temas como “Hang Out” e “Honey Trap” que deixam o público saciado, deixando uma espécie de sabor de boca de que alguma coisa no nosso interior foi remexida, embaciada docemente e polida com a manga para depois ser colocada no sítio. Como deve ser.


Encantaram os média internacionais, que se apressaram a apanhá-los numa entrevista. Os Paus inauguraram o Palco Optimus no último dia com um saldo positivo, e chegando mesmo a encantar a afluência estrangeira que lá estava. Não é de estranhar. Afinal, a disposição do grande palco principal do festival fazia com que o grupo, bem junto e coeso, pudesse parecer uma ninharia. Enganosa, no entanto, pois a forma como o estilo musical dos Paus invade o terreno faz lembrar um grupo que se espalha por toda a plataforma. O frente a frente do costume na bateria de Joaquim Albergaria e Hélio Morais não desilude se estivermos à espera de uma carga de tabefes quase ao desafio. Parece que cada um se dedica a puxar o outro ao seu limite. Mas para muitos, estão habituados, e apreciam como um parente orgulhoso apesar dos filhos estarem sempre a atirar galhardetes e acabarem por cair numa poça completamente vestidos após uma escaramuça. Tal paternalismo e familiaridade chegam o ponto em que inclinamos a cabeça aquando o apelo ao striptease, quando começam a tocar “Tronco Nú”. Ainda assim, a efusão do público em cada canção como “Mudo e Surdo” e “Malhão” transforma-se num ciclo vicioso: visivelmente tocados pelo entusiasmo do público, tanto Makoto Yagyu como Hélio se atiram ao mesmo para fazer crowdsurf. A notar fica o facto de ambos entrarem rapidamente em ritmo com os demais que permaneceram a tocar. “Fizeram-nos muito felizes hoje,” dizem, gratos pela reação excitante de um dos festivais mais importantes a nível nacional. Esperemos que o concerto tenha aberto portas, porque afinal, o nacional é bom.


Entretanto, as Warpaint tocavam no Palco Heineken. Um grupo composto só por elementos no feminino, tocam no que parece umas guitarras abafadas pelo pó, de tanta história que cantam. O próprio tom de voz de Jenny Lee Lindberg é sonhador, quase vindo do outro lado do túnel, daquele género que nos guia até à luz, mas parece ganhar vida em certos momentos de maior catarse, seguida frequentemente de um solo de guitarra que embora longe de complexo, ainda é intrínseco. A construção de cada cantiga é fruto da amizade de longa data dos membros Emily Kokal, Theresa Wayman, Jenny Lee Lindberg e Stella Mozgawa, e isso é aparente – especialmente em canções como “Baby”, “Elephants” ou “Undertow”, - na forma como evoluem, quer seja a partir da letra suave, da linha do baixo, dos acordes de uma guitarra, até tudo se compor gradualmente. A criação de uma atmosfera que remete a uma versão no feminino de desert rock psicadélico – e o refrescante que é - foi mais do que adequada para o final daquela tarde de verão.


Os The Kooks, mostraram-se no palco principal após um intervalo de apenas um ano em terras lusas (tendo estado no Super Bock Super Rock, edição de 2011), e depois de outro de mais 2 anos, tendo marcado presença na edição de 2009 do mesmo festival. Para apresentar o seu novo álbum «Junk of the Heart», mostraram uma energia infindável que é bem conhecida e, se não, extremamente alertada pelo tom das suas canções. Luke Pritchard, o vocalista tão adorado pelas fãs, comenta como é uma honra estar num “alinhamento de tanto prestígio”. Se o objetivo daquele concerto (como todos os outros) é pôr as pessoas aos saltos, mesmo aqueles que por lá passavam (e não ficavam) caminhando com um pequeno salto no andar, foi missão cumprida. Nada que não admirasse: a simpatia espalha-se mesmo em temas como “Sofa Song” e “Ooh La”, em estilo mesmo poptimista, apesar da forma como a banda continua a tentar assumir-se como banda rock. É fórmula que funciona em festivais de verão? É, sim senhora. O senhor Luke Pritchard e companhia são sempre recebidos de braços abertos em terras lusas.

Márcia invade o Clubbing para muita gente a seguir. Considerada uma das maiores revelações do panorama nacional, fica espantada quando nota as pessoas a cantar a letra das suas canções, temas do seu álbum «Dá». Enquanto troca de guitarras, tira o xaile, agradece a presença dos muitos que lá ficavam, por entre os outros que iriam assistir aos The Kooks, e canções entoadas com uma voz calma e doce.

O Palco Heineke recebe outra enchente, desta vez com a atuação dos Maccabees. Ainda assim, são os elementos do público de nacionalidade britânica os que mais aplaudem e dão as boas vindas ao grupo conterrâneo. A banda apresenta o seu novo álbum «Given to the Wild», do qual vêm temas como “Feel to Follow” ou “Pelican”, baseadas no equilíbrio entre a teatralidade e o minimalismo em crescendo (muito usado graças ao sapateado nos vários pedais) que acompanha a voz de um carisma impressionante de Orlando Weeks. Este consegue atingir agudos e graves com facilidade e apesar de discreto e algo humilde, ainda passeia pelo palco. Há um certo tema de mortalidade e finalidade nas canções do grupo, o qual passa quase despercebido no meio de uma sonoridade electro e saltitante – bastante visível nos pés de Weeks e os do guitarrista Felix White – e que muitos decidem ignorar em prole dos ritmos contagiantes, mesmo quando se pergunta “Do you miss home?” em “First Love” de «Colour It In», o álbum de estreia da banda datado de 2007. O contraste e a súbita maturidade entre as canções dos diferentes álbuns é um fenómeno estranho, e dá-nos a sensação de estarmos a observar um caminho de uma personagem de uma série televisiva, a qual só assistimos o primeiro e o último episódios, mas só quando o concerto acaba é que o público parece reparar nessa finalidade, algo a contragosto, e insiste com a sua presença junto ao palco mais uns momentos, para ver se não o espetáculo continuava durante mais um bocado.


Dan Snaith é conhecido como, ao invés da sua licenciatura em matemática, entregar-se à sua música como um animal selvagem. Isto se por “animal selvagem” considerarmos que será o mais racional e dado à eletrónica de todos. A mistura entre a natureza crua e o sintetismo musical é uma interessante dicotomia e o facto de se transformar em fluidez quando os Caribou se agregam no palco deverá ter apelado a Thom Yorke, dos Radiohead, pelo que o grupo está de momento em digressão com essa mesma banda. Este experimentalismo latente em temas como “Odessa” ou “Sun” leva o público a fechar os olhos e balançar mãos no ar, como se de eletrónica se apanhasse um bronzeado, já que o sol já se teria posto. O público do Optimus Alive estava ali maioritariamente para o concerto que viria a seguir, os próprios companheiros de digressão, e a quantidade de gente adicionada à ansiedade da atuação mais pedida desde o início do século XXI começava a causar a sensação de sardinha em lata, mas a verdade é que os Caribou sucederam em criar uma tribo urbana baseada em ritmos e notas de sintetização (não resumida) e circuitos que transportam a uma lounge sofisticada na praia.

De volta ao Clubbing, B Fachada começa logo por avisar os que por lá pairam que o reportório e setlist que planeia em apresentar em palco são diferentes dos “discos pedidos” que o público poderá querer fazer. Afinal, Bernardo Fachada queria mostrar o seu novo e veraneante álbum «Criôlo» (disponível também em formato online para escuta e download), mais do que passar as músicas mais conhecidas. É com esta personalidade algo irónica e demarcada, ciente do percurso do músico (e o público que o siga) que passa temas como “Afro-Xula” ou “Quem Quer Fumar Com B Fachada”. Temas igualmente electrónicos (e se não o eram, talvez tenha sido influencia de Caribou que inundava grande parte do espaço sonoro, pois latejava ali mesmo ao lado) quanto influenciados até pelo verão e ritmos jamaicanos e africanos. Para que não deixe dúvidas sobre o título do álbum.


Era também há muito esperada a vinda dos Mazzy Star ao terreno português e a voz de dúlcida de Hope Sandoval, agora com 46 anos, e depois de um hiato de cerca de 16 anos. Mais discretos que muitos técnicos de som (há que dizer, no Palco Heineken as travessuras sonoras tornaram-se uma fonte de entretenimento à parte, e espreitar as mãos e os pés a manusear cabos e a andar de um lado para o outro para tentar retificar cada guincho de feedback), perguntamo-nos se a luz proporcionada é suficientemente escassa para a cantora. Começa com as canções “Disappear” e “Blue Flower” de estado de espírito adolescente e leniente enquanto David Roback toca os acordes de canções bem conhecidas pelos meninos dos 90. De olhos fechados e pandeireta em punho, balança ligeiramente como indiferente ao escasso público que lá ficou em oposição ao zumbido de “Radiohead” do outro lado do recinto e que segue a dupla com devoção quase cega. Não é de admirar, ao escutarmos canções de sereia que sofre e sente frio debaixo de água. É uma desolação que se encaixava em alguns recantos sombrios da sobriedade (ou falta dela) dos anos 90 e que proporcionam um ambiente de mistério e rock solitário ainda hoje. Hoje, talvez seja solitário demais, especialmente quando o mais comercial “Fade Into You” baixa até aos acordes finais e o público é desterrado. Talvez seja difícil ter uma noção de abandono no meio de mais de 55 mil pessoas que queriam ver uma banda de Oxford, mas talvez tenha sido isso mesmo que se pudesse alcançar no Palco Heineken, por essa hora. Missão cumprida? Fica a ideia de voltarem quando o seu novo álbum sair, talvez numa Aula Magna, ou num palco fechado.


Muito antes de o concerto começar, alguém disse: “Estou desapontado. Ouvi dizer que o concerto seria todo do «King of Limbs».” E quem disse isso primeiramente não estava exatamente correto, mas menos estava errado. A formação inglesa está muito longe de se definir pelos temas que inundaram as cabeças encapuçadas por camisas ao xadrez e tocaram em walkmen e discmen com temas como “Karma Police” e “Creep”. Não obstante a qualidade dessas canções que atingiram o auge comercial e os rankings de músicas que tocam tanto a nossa história pessoal como o nosso subconsciente, os Radiohead são agora completos génios loucos num laboratório musical, pelo que menos interessados estavam a mostrar “oldies” que por mais marcantes que fossem, fazem parte do histórico da banda. Talvez cruel, especialmente para um público que os esperava durante 10 anos, durante os quais ainda editaram 3 novos álbuns, mas os Radiohead incluíram-se durante essa temporada como um caso à parte dos maiores grupos de impacto internacional. “Não me importo,” diz uma rapariga com sotaque nortenho bastante carregado. “Eu gosto deles assim, pequeninos, empertigados e zangados!”
Entram, lentamente, e tomam os seus postos. E, como se soubessem das previsões que enchiam os media da especialidade, pregam uma partida e decidem desafia-los. Um “e se tocássemos só essas canções?” e o público até ficou expectante para saber o que viria a seguir ao primeiro tema, “Bloom” muito ao jeito de Drum’n’Bass com a misticidade dos zumbidos de Yorke e o devaneio ambiental dos arranjos quase orquestrais. Esta canção dita logo o tom do concerto, a postura de cada um no palco, mesmo quando a visibilidade da maior parte do público é reduzida. Estes senhores não brincam em serviço. As câmaras que costumam captar imagens do que se está a passar no palco e projetam para os grandes ecrãs, desta vez, incluem uma disposição sui generis, criando um espetáculo visual mais do que somente relatar o ato. Apanhando quase cada membro em dois ângulos diferentes, a performance dos Radiohead não se limita só às capacidades exímias da voz de Thom Yorke, da criação de sonoridades pelos restantes membros e nos arranjos experimentais na reinvenção de cada tema. Passando depois por “15 Step” e “Good Morning, Mr. Magpie” (o primeiro de «In Rainbows» e o segundo voltando para «King», para depois voltar mais uma vez a «Rainbows» com o tema “Weird Fishes/Arpeggi”, o qual causou algum histerismo ao meu lado), as sequências rítmicas eram intrínsecas como um corpo aquático. Pode-se chegar a dizer que a atuação é perfeita, que este grupo também composto pelos irmãos Jonny e Colin Greenwood, Ed O'Brien e Phil Selway, são tão conexos quanto uma sequência informática em sincronia e complementação quase simbiótica. “Estes gajos são mesmo bons,” repete-se.
Quem esperava um espetáculo que cheirasse a sangue, suor e lágrimas até onde a multidão começava a escassear, poderá ter saído desapontado. Para uma performance sem mácula basta ouvir o disco, poderão defender, pois o experimentalismo pode ser tão perfeito que parece não ser feito em tempo real. Mas o esforço na precisão (em versões de canções subtilmente exploradas) está lá. Evidente. Pelo menos para quem se tenta dar ao trabalho de olhar para os ínfimos detalhes – e não é segredo que o grupo se dedica a esconder ovos da Páscoa para descobrirmos de propósito ou mero acaso. Outros colocam-se no espetro oposto, fecham os olhos, balançam a cabeça, e apenas se deixam levar por cada pauta e tablatura intrincada sem pensar muito no assunto.
Foi surpresa para muitos que nunca tinham assistido a banda ao vivo que se depararam com o facto de que, por trás da intensa cerebralidade das canções dos Radiohead, houvesse tanto empenho e embrenho físico dos elementos. Em particular de Thom Yorke, que quando não se dedicava aos arranjos vocais e aos instrumentos que tocava, agitava-se, mexia-se com (falta de) naturalidade dos seus membros franzinos, esticava-se e dobrava-se como se estivesse a ser exorcizado, tal entranhado na música se colocava. De certa forma, e para um autor de canções que falam tanto no vazio do interior da sociedade humana, cada concerto talvez o seja.
Uma coisa é certa. O grupo procede, sucede e consegue criar dos ambientes mais intensos com um simples acorde num piano e a voz quase fantasmagórica de Yorke, seja em recintos fechados ou abertos, seja com edição posterior ou a rudeza do ao vivo, sujeita a qualquer imprevisto. Tal foi evidente em temas como “Pyramid Song”, em que o próprio crooning foi imitado pelo público, “Exit Music (For a Film)” – e não digam que mais de 50 mil pessoas a murmurar “we hope that you choke” não causa pele de galinha – “Idioteque” e “Paranoid Android” e “Everything in its Right Place” (únicas revisitações aos temas mais conhecidos da banda), durante os quais a empatia do público foi tão palpável que se colava como uma película de humidade na pele.
De tal modo que ao segundo encore, o público (mesmo os mais céticos) ainda estava a dizer “Não, para onde vão? Voltem!”. E a banda percebeu: “Dez anos é demasiado tempo,” admite com voz ofegante Yorke, entregando uma canção que para o mesmo se trata de um risco, do mais sentido que podemos esperar. Terminando com o conselho “Immerse your soul in love”, e prometendo tentar voltar com menos tempo de intervalo. Esperemos que sim. A verdade é que a muitos esfomeados, este concerto ainda soube a pouco. Ainda que o grito final foi “Thom Yorke, tu és um patrão!”


Logo que os Radiohead mostraram que se foram do palco de vez, muitos resistentes (e insistentes) ainda por lá ficaram. Por isso, a invasão da tenda em frente do Palco Heineken não foi imediata, mas foi gradualmente aumentando até à plenitude, contrariando a ideia de que muitos lá foram só para ver a banda rock. Os SBTRKT (“Espera. Como é que tu dizes isso, mesmo?” “Subtract.” “Aaah!”), ou seja, o produtor britânico Aaron Jerome mostrou-se de cara (quase) destapada e, junto com o vocalista Sampha, lançaram o mote: dancem, meninos, dancem. De baixo do mais pesado que há e ritmos emprestados ao pop, as canções mais possantes mostraram-se “Hold On” e “Right Thing to Do”, mas o clímax chegou mesmo na versão nova de “Wildfire”, à falta de Yuki dos Little Dragon (houve quem esperasse que tivesse ficado por cá e dado uma espreitadela ao festival após a sua performance no Super Bock Super Rock, mas isso é puro otimismo a falar). Mesmo enquanto alguns iam buscar farturas e se sentavam à frente das roulottes de comes e bebes, o ritmo ateava-se em todos. O DJ agradece e elogia a “great crowd” que está na sua frente.


Estando o público todo movimentado para o palco secundário, a enchente e o espectáculo que se seguiu foi dos mais interessantes do festival inteiro, tendo alcançado um registo emocional que influenciou as duas rockstars que a ele subiram. Os The Kills poderão ter mesmo ficado para a história do festival. Allison Mosshart, vulgo “VV”, parece uma pantera enjaulada no palco, anda de um lado para o outro em passadas largas e larga rugidos melódicos em canções bem conhecidas do público: primeiro, “No Wow”, do álbum com o mesmo nome, e “The Future Starts Slow”, do último trabalho «Blood Pressures». De cabeleira farta e agora loira com pontas cor-de-rosa, a cantora perde-se no palco e nas canções, mexe-se com abandono ao som da guitarrada impressionante de Jamie “Hotel” Hince. Os bateristas no fundo só serviram para ilustrar de forma sonora os passos dos dois gigantes do rock que estão no palco, a entregar canções como “Heart is A Beating Drum”, “Satellite” e “Baby Says”.

A apoteose deu-se, no entanto, quando Mosshart começa com “The Last Goodbye”, uma balada que corta o ritmo, dá uma certa pausa a toda a falta de freio que, no entanto, se mantém gutural e extremamente instintiva, bonita de se ver. Aqueles que provavelmente estão muito perto de se tornar uma das mais carismáticas bandas de rock contemporâneo (se não o são já) desceram à terra e mostraram-se humanos. Aí, Allison para quando olha para o público e encontra um fã desmaiado, interrompe tudo, faz os possíveis para que seja atendido e dedica-lhe a canção quando retoma o seu posto. Essa sensibilidade e a ideia de que de facto aqueles dois seres, capazes de criar as canções de puro rock, estão ali a olhar para o público, a uma distância de três braços, e não estão ali só a atuar para uma massa anónima, “só” causou a mais emocionada empatia do público. Gritavam por ela, por ele, por mais, gratos, criando um cenário dos de mais devoção do festival. Por momentos Allison, permaneceu em pé junto à beira do palco, ao som da guitarra de Hince, e deu-se um momento mesmo ali, na sua face, que se quebra num dos maiores sorrisos a aparecer em todo o festival. “I love you guys so much, this is insane! You guys are amazing!” ela exclama antes de se atirar ao bombo com tamanha força em “Pots and Pans”, que se esperava que a pele quebrasse. Jamie Hince faz questão de dizer que o tema “Fuck the People” tem um significado especial, que o deixam para o final para que todos se deixem levar pela sua intensidade, mas que o público português talvez seja “o mais dedicado que encontrou”, e talvez não fosse preciso. No final, os abraços e beijos emocionados eram muitos, e desta vez, o público também se sente realizado, ao transmitir tamanha efusão.


O consenso era geral: 3 horas da manhã num domingo para ver Metronomy talvez tenha sido puxar demais. No entanto, o vocalista Joseph Mount tentou parar o público de pensar no assunto: “Do you have to work tomorrow? Forget about it!” Os Metronomy são um grupo que se pode inserir na linha dos Phoenix, dos Passion Pit, mas a verdade é que as comparações ao vivo são injustas. O Optimus Alive de 2012 não poderia ter pedido melhor fecho com o confiante ensemble de hits que foram oferecendo, mesmo que singles como “The Look” (que causou maior sensação entre o público) e “Everything Goes My Way” não apresentem propriamente letras para um local dedicado à dança, seja ela pista ou chão empoeirado de festival. Os ritmos simples mas eficazes com um toque de cabeça a abanar de um lado ao outro em tom de brincadeira fechou o festival, o qual ainda soou desapontado, de tão curto que foi (ou pareceu).


REPORTAGEM OPTIMUS ALIVE 2012:
1º Dia (13 de junho 2012)
2º Dia (14 de junho 2012)
3º Dia (15 de julho 2012)

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Texto: Carolina Rocha
Fotos: Rúben Viegas
Agradecimentos: Everything is New
Festival: Optimus Alive
Local: Passeio Marítimo de Algés
Data: 15 de junho de 2012

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